Dep. Carlos Zarattini | 25/09/2017 | 16:59:25
Fonte: Exame

Em uma união rara em um mercado cada dia mais competitivo, Uber99 e Cabify se juntaram para tentar frear o Projeto de Lei 28/2017, que, na prática, pode inviabilizar o modelo de negócios do transporte por meio de carros particulares da forma que é feito hoje.

Na semana passada, o projeto, que já foi aprovado na Câmara, foi incluído em regime de urgência na pauta da Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT) do Senado, onde pode ser votado nesta terça-feira.

No final da tarde desta segunda, representantes das três empresas, Guilherme Telles, do Uber, Daniel Marcelo Velazco-Bedoya, do Cabify e Matheus Moraes, do 99, fizeram um pronunciamento conjunto por meio do Facebook para mobilizar os usuários das três plataformas a protestarem contra o projeto de lei.

De autoria do deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), a proposta impõe uma série de regulamentações ao serviço. Entre as exigências, a que mais tem incomodado as empresas é a utilização de placas vermelhas, como as de táxis, assim como a necessidade de uma autorização específica do poder público municipal para a prestação do serviço.

O transporte, que as empresas defendem ser privado, seria transformado em transporte público de passageiros, criando uma série de regulações e burocracias.

“Na prática, isso não é uma regulamentação, é uma proibição. A burocracia eliminaria o acesso ao trabalho para muitas pessoas que se sustentam por meio dos aplicativos. Por exemplo, aqueles que alugam o carro para poder dirigir, além dos que dirigem só como complemento de renda. Essas pessoas não terão como continuar trabalhando”, diz Matheus Moraes, diretor de Política e Comunicação da 99.

“Não somos contra a regulamentação. Ela, inclusive, nos daria segurança jurídica. Mas esse projeto foi feito com intuito de inviabilizar o transporte privado”.

As empresas apresentaram ainda uma outra proposta de regulamentação que, de acordo com elas, favoreceria a “livre concorrência e livre iniciativa, independentemente do veículo particular e de prévia autorização, permissão ou concessão”.

Pela lógica dos aplicativos, a regulamentação seria a nível nacional e a fiscalização seria feita pelas prefeituras. Para isso, elas poderiam, inclusive, se utilizar dos dados sobre motoristas que são captados pelas empresas nos cadastros, algo que já acontece na cidade de São Paulo.

“A legislação de São Paulo foi bem construída, bastante debatida. O processo foi participativo, por exemplo, ao contrário dessa proposta da Câmara”, diz Moraes, que argumenta que os parlamentares têm se esquivado de um debate com a população sobre o assunto, já que foi imposto regime de urgência para a votação também na Câmara. “É um projeto que vai impactar a sociedade toda e não está sendo devidamente debatido”, diz.

Os aplicativos estão convocando motoristas e usuários a reclamarem nos e-mails e redes sociais dos senadores, além de reunirem assinaturas para serem enviadas ao Congresso na tentativa de travar a proposta.

Os três aplicativos ainda planejam uma ação publicitária que deve começar a ser veiculada a partir desta terça com intuito de mostrar o posicionamento das marcas diante do projeto de lei.

O vaivém da lei

O projeto aprovado pela Câmara e que agora está no Senado passou por diversas modificações ao longo de sua tramitação. O texto apresentado por Zarattini foi substituído por outro, de autoria de Daniel Coelho (PSDB-SP).

Esse último era mais amigável aos aplicativos, retirando algumas exigências, tidas como desnecessárias. Uma emenda feita no apagar das luzes, no entanto, eliminou a palavra “privado” do texto, o que, na prática, fez com que o serviço se tornasse passível da série de exigências que constam na proposta, como a da placa vermelha.

Desde que começaram a operar no país, essa foi a maior derrota política das empresas de transporte privado de passageiros. Embora tenham apresentado seu próprio projeto ao público, ele ainda não foi encampado por nenhum político.

Outra proposta, apresentada pelo senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), também agrada aos aplicativos porque, de acordo com eles, seria mais “técnica”, sem um viés político.

“Não é fácil evoluir com projetos em nosso país em função das reações corporativistas. Os políticos não gostam de enfrentar essas questões, preferem não bater de frente [com os taxistas]. O que precisamos fazer com esse tipo de transporte é regulamentar, criando regras claras, limites e igualdade de oportunidades com o taxista”, disse Ferraço em entrevista a EXAME há duas semanas. “Os políticos se equivocam e erram quando tentam proibir ou fazer movimentos que levem a proibição”.

Caso seja realmente votado e aprovado nesta terça na CCT, o projeto segue para o plenário do Senado. Se passar por lá também, vai para a sanção presidencial. Até aqui, o Planalto estaria inclinado a vetar um projeto que tenha um viés proibitivo, mas, na dúvida, Uber, 99 e Cabify preferiram se aliar aos concorrentes para combater o que seria, para eles, um mal maior. Como diz o ditado, o inimigo do meu inimigo é meu amigo.


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